DE VOLTA PARA AS BASES E O MANIFESTO PELO AMOR RELEVANTE

quinta-feira, março 31, 2016 Marcos Henrique de Oliveira 0 Comments


O amor pode ser, e frequentemente é, tão atemorizante quanto a morte. Só que ele encobre essa verdade com a comoção do desejo e do excitamento. Faz sentido pensar na diferença entre amor e morte como na que existe entre atração e repulsa. Pensando bem, contudo, não se pode ter tanta certeza disso. As promessas do amor são, via de regra, menos ambíguas do que suas dádivas. Assim, a tentação de apaixonar-se é grande e poderosa, mas também o é a atração de escapar. E o fascínio da procura de uma rosa sem espinhos nunca está muito longe, e é sempre difícil de resistir.Zygmunt Bauman em Amor líquido

De tempos em tempos, gosto de voltar para as coisas que ajudaram na minha formação pessoal como as músicas, filmes e livros que li, assisti e ouvi aos 20 ou 30 anos e coisas assim. Volto para Edgar Allan Poe, para o ACDC, para os filmes de arte alemães e noir dos anos 70, etc. Volto para descobrir se eles ainda fazem sentido, se ainda despertam o mesmo prazer daquela época, se consigo redescobrir algo que a minha idade não captava até então. Volto para saber se eles ainda são relevantes, se ainda têm real importância para fazerem parte da minha vida. Nesse sentido, me considero conservador porque não sigo nenhuma moda do momento e não troco, facilmente, um modelo de vida por outro. Somente o que considero relevante, permanece.

Tenho pensado muito sobre relevância, aquilo que é realmente importante e não pode ser trocado, assim, sem mais nem menos. Ou, segundo a Wikipédia,   tudo o que merece atenção e é pertinente. Mas até mesmo a minha personalidade pragmática e lógica (algo entre uma máquina de lavar e um liquidificador ou uma mistura do Dr. Spock com o Dr. House) anda meio espantada com o movimento das coisas.

A velocidade oferecida pelas mídias sociais, a liberdade usada como máscara para os desejos e a total falta de profundidade nos assuntos, me fazem pensar se não entramos, talvez emocionalmente cedo demais, no trem-bala que não permite apreciar a paisagem. E surge a pergunta: afinal, o que é relevante?


"Indivíduos frágeis”, destinados a conduzir suas vidas numa “realidade porosa”, sentem-se como que patinando sobre gelo fino; e “ao patinar sobre gelo fino”, observou Ralph Waldo Emerson em seu ensaio Prudence, “nossa segurança está em nossa velocidade”. Indivíduos, frágeis ou não, precisam de segurança, anseiam por segurança, buscam a segurança e assim tentam, ao máximo, fazer o que fazem com a máxima velocidade. Estando entre os corredores rápidos, diminuir a velocidade significa ser deixado para trás; ao patinar em gelo fino, diminuir a velocidade também significa a ameaça real de afogar-se. Portanto, a velocidade sobe para o topo da lista dos valores de sobrevivência.
A velocidade, no entanto não é propícia ao pensamento, pelo menos ao pensamento de longo prazo. O pensamento demanda pausa e descanso, “tomar seu tempo”, recapitular os passos já dados, examinar mais de  perto o ponto alcançado e a sabedoria (ou imprudência, se for o caso) de o ter alcançado. - Zygmunt Bauman em Modernidade líquida.
Uma triste verdade é que a chamada "Geração Y", a geração de jovens nascidos entre o fim da década de 1970 e a metade da década de 1990, não vingou nem nas expectativas, nem nos resultados. O mundo pode ser cruel com os sonhadores ambiciosos. Frases motivacionais e de autoajuda não funcionam em um centro pessoal acelerado ou distante de seu próprio núcleo formativo.

Querer não é mais Poder no mundo contemporâneo. Para querer Poder, é preciso conhecimento. E esse conhecimento, só pode ser adquirido com o tempo dedicado ao seu entendimento, tempo que as pessoas não se permitem mais ter. Bem-vindo à vida moderna sem reflexão.

Existem várias definições sobre reflexão. A que mais gosto é aquela que fala em dobrar-se sobre si mesmo. Poderia até se imaginar uma pessoa, em posição fetal, ruminando sobre a própria existência. Pensar sobre os problemas do cotidiano não é reflexão. Pensar sobre as dívidas, amores mal resolvidos, etc também não é reflexão. A reflexão exige que a pessoa "se desdobre" daquela situação negativa e volte para o seu estado, considerado normal e saudável. Portanto, se você não consegue voltar, não está "refletindo de volta" a negatividade que pode estar dominando os seus pensamentos e atitudes. 

O que nos leva ao tema principal desse artigo: o amor nos tempos de Facebook e Whatsapp e a sua relevância.


Os adolescentes equipados com confessionários eletrônicos portáteis são apenas aprendizes treinando e treinados na arte de viver numa sociedade confessional – uma sociedade notória por eliminar a fronteira que antes separava o privado e o público, por transformar o ato de expor publicamente o privado numa virtude e num dever público (…)
Nós somos responsáveis pelo outro, estando atento a isto ou não, desejando ou não, torcendo positivamente ou indo contra, pela simples razão de que, em nosso mundo globalizado, tudo o que fazemos (ou deixamos de fazer) tem impacto na vida de todo mundo e tudo o que as pessoas fazem (ou se privam de fazer) acaba afetando nossas vidas. – Zygmunt Bauman em Modernidade Líquida.
Peço, por gentileza, que você se esforce para não enxergar o que vou escrever como um saudosismo triste ou um romantismo ingênuo e fora de época, combinado?

Eu tenho alguns dados interessantes para você:  A idade média do homem ao se divorciar, passou de 44 para 43 anos, entre 1984 e 2014, enquanto a das mulheres era de 40, nos dois casos. Em outras palavras, em 10 anos, a taxa de divórcios cresceu mais de 160%, apenas no BrasilEnquanto 2014 terminou com 1.153 divórcios, 2015 fechou o balanço com 1.193 casais desfeitos. A tendência tem sido mantida ao longo dos últimos 11 anos. E, é claro que a atual crise também tem jogado esses números para cima, mas isso não serve de desculpa para nada.

Como diz Julia Kristeva (em Nações sem Nacionalismo), “é rara a pessoa que não invoca uma proteção primordial para compensar a desordem pessoal”. E todos nós, em medida maior ou menor, às vezes mais e às vezes menos, nos encontramos em estado de “desordem pessoal”. Vez por outra, sonhamos com uma “grande simplificação”; sem aviso, nos envolvemos em fantasias regressivas cuja principal inspiração são o útero materno e o lar protegido por muros. – Zygmunt Bauman em Modernidade Líquida.
Nosso "lar protegido por muros" (mas com Wi-Fi) que nos tornaram frágeis para desilusão de um amor não correspondido, para a briga de afetos e a rejeição do tato e do toque. Ou o inverso, a descoberta da paixão tola, da alegria ingênua e adolescente da troca de olhares e o flerte (eita palavrinha velha e esquecida) que alimenta ainda mais a vontade de conhecer, tocar e conviver o máximo possível, não com o "objeto do amor" mas com uma pessoa de verdade, não virtual. Avisei que você iria pensar que sou um saudosista, não avisei?


A essência, tanto da presença quanto do amor romântico, se perdeu entre selfies e nudes, entre vídeos amadores de sexo adolescente e adultos (supostamente maduros) que se consideram modernos porque mandam uma foto da própria genitália. Nos tornamos menos surpreendentes, menos misteriosos, menos necessários da descoberta pelo outro.  Selfies sorridentes parecem propagandear que nos bastamos na nossa felicidade, enquanto os casos de solidão e depressão aumentam e os, já citados, divórcios também. Qual é a verdade, então?

Ondas de empoderamento masculino e feminino (a nova moda pós-moderna do machismo e feminismo) inundam as redes sociais com frases feitas, clamando respeito e consideração por um e outro lado. Porém, na calada da noite, novos instintos tomam conta e dá-lhe whatsapp e sexo virtual até de madrugada. Sim, eu sei que isso soa muito "velho" da minha parte mas continue lendo, ok?

Gostaria de lembrar que não estou do lado dos queridos leitores da terceira idade que acompanham esse blog, aqueles nascidos lá nos anos 40. Estou do lado da relevância e não de uma mentalidade do tipo "só depois que casar" ou coisa do gênero. Não é uma questão de repressão ou uma volta aos anos 50 com toda aquela sexualidade reprimida dos pais de nossos pais, etc. O ponto aqui é quanto você valoriza, de verdade, a sua importância. Não social (selfies), não profissional (status), não sexual (nudes). Não é, portanto, uma questão moral ou ética. Estamos falando do "você" orgânico, não do digital/virtual, certo?


Entre esse Dr. Sociedade e Mr. Internet, permanece a dúvida entre aquilo que realmente queremos, desejamos ou precisamos. Se você tem entre 15 e 25, confundir amor com sexo, faz parte. Mas como diria a Rita Lee, "Sexo vem dos outros, e vai embora/Amor vem de nós, e demora". Sim, demora porque precisa amadurecer mas ninguém está afim de esperar. Amor e Sexo virou programa de televisão, um clichê para ser consumido e trocado, de preferência, rapidamente e sem dor. Pelo menos é o que se pensa.

A desordem pessoal, como citado por Bauman, nasce da ignorância oportunista da oferta e procura virtual. Todo mundo se basta mas ninguém quer ficar sozinho. Tudo mundo é autossuficiente mas carece do outro idealizado. Todos os dias, oferecemos pedaços virtuais de nós mesmos mas nunca nos oferecemos por inteiro (O amor pode ser, e frequentemente é, tão atemorizante quanto a morte, lembram?). Mr. Internet é a nossa sombra noturna, Dr. Social, nossa imagem de perfeição em comunidade. Ambos se completam na falta e na necessidade de contato humano.

Alguns homens cresceram assistindo o modelo masculino dos faroestes, outros das lutas do MMA. Quase todas as mulheres cresceram junto com as princesas da Disney e descobriram 50 Tons de Cinza e Jogos Vorazes. Ambos os sexos não sabem bem o que fazer, de verdade, com a própria liberdade oferecida por um toque do mouse. O Poder foi dado sem conhecimento e relevância. Se tudo é importante então nada é importante, percebem? Nesse caso, voltar para suas bases, reencontrar o sentido de tudo isso, pode ser uma boa.


Posso estar errado (e sendo chato, muito chato) mas nudes me lembram uma flor que, quando oferecida todos os dias, perde o seu perfume e relevância. Selfies soam como uma necessidade de acreditar (e mostrar) que tudo está bem "apesar de". E os vídeos de sexo amador são... apenas vídeos de sexo amador.

Já que estamos na "moda" de fazer passeata para tudo, aguardo ansiosamente por uma passeata que celebre o Amor antes da internet. Não o amor romântico da sofrência (que acaba virando caso de violência e polícia). Não o amor minúsculo das redes sociais, migalhas oferecidas aos carentes de plantão, esse não. Marcharemos pelo amor de contato, o amor que celebra a pessoa que consegue colocar um sorriso na gente, mesmo em tempos difíceis, para nos lembrarmos do que realmente importa. E pode ser amor de amigo, de namorados, de casados e reencontrados. 

Taí um bom tema para reflexão. E se for montar a passeata, me convide. Até a próxima.


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