Minha primeira vez por Toni Diniz

segunda-feira, outubro 11, 2010 Marcos Henrique de Oliveira 0 Comments

Como já diz o ditado, a primeira vez a gente nunca esquece. Escrevi o meu primeiro roteiro quando eu estava na 8ª série do ensino fundamental, mas se engana quem acha que foi algo planejado. Não, não foi. A experiência foi bem triste e foi gerada por uma situação, no mínimo, vergonhosa. 

Quem nunca teve uma professora para chamar de bruxa? A minha era a de português, embora fosse a matéria que eu mais gostava. Um dia, a dita cuja chegou na sala dizendo que iríamos apresentar uma peça teatral. Até aí tudo bem, atuo desde os 9 anos de idade. Foi quando, ela passou o roteiro que iria ficar com o meu grupo, nada menos que O Rei da Vela, peça de Oswald de Andrade.

O texto não era nada fácil, obra escrita a partir de 1933, depois da crise de 1929. É considerado o primeiro texto modernista para teatro. Uma crítica a situação e à sociedade da época, a obra conta a história de um agiota sem caráter e não pensava duas vezes para deixar totalmente sem nada aqueles que deviam para ele. Oswald de Andrade dá à obra um enfoque marxista a sociedade decadente, com a linguagem e o humor típicos do modernismo.

A peça é maravilhosa, o problema era como fazer isso em duas semanas e com um grupo onde a maioria não tinha experiência nenhuma com o teatro. Ensaiávamos nos intervalos e nos fins de semana, tudo era motivo para o grupo reclamar, principalmente a linguagem culta com os seus verbos perfeitamente conjugados.

Depois de alguns ensaios e de muitas discussões, principalmente com a professora, que se negava a nos dar outro texto, chegou o dia da apresentação. O auditório da escola estava lotado, todos os alunos, pais e convidados. Eu estava super nervoso, lembro que o meu personagem era um idoso e eu tinha que colocar uma enorme barba branca para dar vida a ele.

Começa a apresentação, silêncio total no auditório, só dava para escutar a voz do coitado que foi encarregado de ser o protagonista com suas falas de dez linhas ou mais. Tudo corria bem, na primeira fila estava a professora com o roteiro na mão, acompanhando e se encarregando para que nenhuma fala fosse dita de forma errada.

De repente, um silêncio tomou conta, não se ouvia mais a voz de ninguém. Eu ainda não tinha entrado em cena, e curioso, olhei por trás da cortina e vi o protagonista com a cabeça baixa e chorando. Tudo estaria perfeito, mas isso não estava escrito no roteiro. Ouço um grito, era a professora quebrando o silêncio perturbador com a sua voz mais perturbadora ainda: “Pára tudo!” disse ela. 

Não vale a pena falar do que ela nos chamou naquela manhã e na frente de todos os pais. Só para ter uma ideia foi de irresponsáveis para baixo. O garoto havia esquecido as falas, o que resultou na maior humilhação de minha vida escolar. Todos os “atores” foram chamados ao palco e ouvimos tudo o que não merecíamos.  Estávamos todos com zero de nota e sem chance nenhuma de salvação. Foi quando, meu pai, chegou com toda a calma que ele tinha e sugeriu a professora uma nova chance para todos dizendo que não era justo fazer aquilo com os alunos. Depois de muito insistir e de muito apelo de outros pais, foi dado o decreto. Tínhamos uma semana para escrever um novo roteiro, ensaiar e apresentar.

Encarreguei-me de escrever a história, foi aí que tudo começou, lembro que tive que escrever em um dia, tudo bem improvisado e não me orgulho do texto que escrevi. Mas enfim, eu escrevi. No dia marcado, estávamos todos lá apresentando uma peça sobre a vida de um adolescente viciado em drogas. Clichê, eu sei. Foi o que saiu da minha mente na época. A experiência foi chata e inesquecível, para o lado ruim mesmo. Mas, serviu para despertar dentro de mim algo que eu não conhecia e que eu faço até hoje: escrever histórias e criar personagens. É como dizem por aí, há males que vêm para o bem.

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